domingo, 30 de dezembro de 2012
sábado, 22 de dezembro de 2012
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
Nasa Gangnam Style
Parece que a febre do Gangnam Style chegou em todo lugar. Primeiro foi a versão Oktoberfest, e depois até as igrejas evangélicas dançaram o hit.
Agora a NASA, maior centro de estudo aero-espacial do mundo, resolveu fazer a sua versão. A paródia ficou bem divertida, fazendo referência ao Johnson Space Center.
quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
Entenda a montagem da águia que tenta roubar uma criança no Canadá
Foi só fazer uma visão apróximada do video pra perceber a falta de sincronia entre o voo da águia e a realidade.
Vejam como ela parece flutuar no ar, mesmo com toda a força precisa fazer para levantar a criança. Inclusive após o suposto rapto, a águia, que normalmente deveria intensificar seu voo, permanece como se tivesse levando algo bem leve.
O que chama a atenção também é o comportamento da criança, que em momento algum esboça qualquer movimento.
Tudo isso indica claramente que se trata de uma montagem. Temos que considerar, porém, que essa é das boas!
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
Saiba como surgiu a profecia Maia sobre o Fim do Mundo!
Segundo interpretações da "profecia maia", o fim do mundo está previsto
para a próxima sexta-feira, dia 21 de dezembro. A ideia de que uma
hecatombe mundial de grandes proporções se abateria sobre a raça humana
na entrada do equinócio de inverno, que ocorre na mesma data, vem sendo
alimentada pelo menos há quatro décadas.
Mas foi nos últimos três anos que a previsão ganhou força, polarizando
aqueles que acreditam piamente no fim dos tempos e os mais céticos.
A BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, decidiu investigar a polêmica. Confira.
De onde vem as profecias?
As interpretações de que o fim do mundo ocorreria no dia 21 de dezembro
de 2012 partiram de dois monumentos maias: a Estela 6 (uma espécie de
totem), do antigo assentamento de Tortuguero (no Estado de Tabasco, no
sul do México) e a Estela 1 de Cobá, em Quintana Roo.
Além disso a próxima sexta-feira é o último dia do calendário criado
pelos maias. Ou seja, não há registro do que viria depois disso. Na
antiga civilização maia, as chamadas 'Estelas' são colunas nas quais se
marcavam as datas de eventos importantes.
Os monumentos também serviam como método de propaganda da elite
política e religiosa. No caso da Estela 6 e da Estela 1, o objetivo era
associar datas "míticas" aos sucessos e governos da época para criar
coesão e controle social.
Monumento 6 de Tortuguero
O monumento Estela 6 foi descoberto em 1957-58. Também é conhecido
popularmente como "a Estela do fim de uma era", e registra o nascimento e
entronização de Apho Bahlam, governador da cidade maia no século VII.
Há também referência à data "baktún 13 4 Ahau 3 Kankin" que, traduzida
para o calendário gregoriano, seria equivalente ao dia 21 de Dezembro de
2012 e corresponde ao fim de um ciclo de 5.126 anos registrados na
"longa contagem" do calendário maia.
"Isso não significa que o mundo vai acabar nesta data, a única coisa é
que esta data vai significar o fim do ciclo baktún 13 do calendário
maia", disse à BBC Mundo o arqueólogo Daniel Juárez Cossío, responsável
pela ala dedicada à civilização maia no Museu Nacional de Antropologia
do México.
"Ou seja, simplesmente, estamos falando do final do baktún 13 para que
se comece uma nova etapa. Trata-se, no fim das contas, de um caminho
novo". O sítio arqueológico de Tortuguero foi roubado ao longo do tempo,
o que dificultou seu estudo e a interpretação completa e
contextualizada da Estela 6.
O Calendário Maia
Trata-se de uma combinação de datas e fatos de batalhas míticas e
desastres naturais que marcaram o desenvolvimento da cultura, com base
em ciclos agrícolas e movimentos de estrelas como o Sol e Vênus.
O calendário não determina apenas a ordem dos dias. Em torno dele foram
organizados feriados religiosos, períodos de cultivo e colheita, a
escolha de nomes para recém-nascidos, sacrifícios humanos e outros
aspectos importantes da cultura maia.
Cossío diz que o fim da "contagem de tempo" é simplesmente "o fim de um
ciclo de pouco mais de 5 mil anos". "Mas os maias não têm uma visão
linear da história, onde há um fim irrefutável. Sua visão é cíclica, ou
seja, algo termina para o início de outra coisa."
Estela 1 Cobá
Estela 1 é localizada em Cobá, uma cidade no norte de Quintana Roo, no
México, que já foi uma próspera cidade maia. Este monumento, com
inscrições em todos os quatro cantos, conta a história de seus
governantes.
Nesta pedra, há quatro referências ao Calendário de Contagem. Uma delas
é uma inscrição mencionando o dia de 21 de dezembro de 2012. No
entanto, o monumento está bastante danificado, o que impede a observação
de quaisquer fatos que teriam ocorrido depois dessa data.
Quando começou a profecia?
Interpretações das "profecias maias" começaram a se tornar populares
nos anos 70 entre pequenos grupos europeus e americanos, que, no calor
do movimento nascente da Nova Era, se aproveitaram das recentes
descobertas na zona maia da península de Yucatán para criar uma
filosofia de vida e, em muitos casos, um negócio lucrativo.
De um lado da moeda, vários grupos dizem que o dia 21 de dezembro vai
registrar um movimento especial de planetas, mudanças na forma em que o
homem se relaciona com o seu ambiente e uma transformação mental e
espiritual da raça humana, que vai alcançar seu auge nesse dia.
No outro extremo, estão aqueles que dizem que, na data, desastres
naturais, crises políticas e econômicas e as guerras travadas ao redor
do globo causarão a derrocada da civilização moderna. Para eles, os
maias teriam deixado suas marcas para nos alertar sobre tais eventos.
Grupos como o Ascensión Nueva Terra e Cambio Nueva Consciencia
asseguraram que os maias previram que um raio de luz do centro da
galáxia irá impactar o sol no dia 20 de dezembro de 2012, mudando sua
polaridade, o que terá efeitos devastadores sobre a Terra.
Os entusiastas do fim do mundo sugerem, ainda, uma série de medidas
para se preparar para "enfrentar o caminho final para a nova luz".
Essa série de previsões levou muitas pessoas ao redor do mundo a
estocar alimentos, construir refúgios e dirigir-se a terras que
pertenceram à civilização mesoamericana.
O que dizem os especialistas?
Segundo arqueólogos e cientistas que trabalham no estudo de
civilizações antigas, os maias não faziam profecias e muito menos
queriam deixar previsões para gerações futuras. Os maias apenas
determinavam o destino de uma pessoa ou de uma cidade com base no seu
calendário e em suas crenças religiosas.
Nesse sentido, Cossío acredita que o dia 21 de dezembro de 2012 "não é
uma profecia". "É completamente e totalmente falsa essa tese de que o
mundo vai acabar com base em algo que estaria disponível. Não há nenhuma
base científica e epigráfica que diz que o mundo vai acabar nesta
data."
O que aconteceu com os maias?
Outra parte importante desta lenda é que, quando os exploradores
europeus e conquistadores chegaram no territórios dos maias, encontraram
muitos assentamentos e cidades antigas abandonados.
Isso criou uma falsa visão de que o povo maia desapareceu sem deixar
vestígio, aumentando o mistério e especulação sobre essa civilização. A
verdade é que os herdeiros diretos da cultura maia ainda existem,
vivendo na mesma terra que os seus antepassados. Muitas vezes, vivem em
condições de marginalização e pobreza no sul do México, Guatemala,
Honduras e Belize.
Fonte: Portal Terra
domingo, 2 de dezembro de 2012
Um menino no jogo
Bastava aquilo. Estava entregue em seus pensamentos e objetivos que só ele entendia. Chutava a bola, ela batia contra a parede e voltava. O desafio era dominar e conseguir, sem deixar cair, devolvê-la contra a parede. Às vezes conseguia. Muitas outras não.
Não era craque, mas tinha um talento pra poucos. Chutava forte e com precisão. Se atrapalhava um pouco nos dribles, mas corria muito. Em suma: era um bom camisa 9.
O menino estava ali há tempos, sozinho, mas em pensamento acompanhado por seus ídolos: Romário, Bebeto, Paulinho Maclarem e o maior de todos: Pelé. Sonhava em fazer gols como eles.
Mas naquele momento, o importante era dominar e chutar. E ele seguia tentando. Quando conseguia, fazia uma grito mudo, quase um assopro, imitando a torcida como se ela vibrasse freneticamente por um gol. Quando perdia, fazia um "huuuuu", como se a bola tivesse batido na trave...
Estava tão concentrado que não percebeu quando, do outro lado do alpendre, chegaram alguns moradores da fazenda. Seu pai estava os aguardando pra passar algumas ordens: cortar canarana, trocar o gado solteiro de cercado, reformar um cocho quebrado, etc. Era o "Doutor", dono da terra e que gerava emprego e renda pra um povo sofrido que não recebia ajuda de muita gente, ou de quase ninguém.
Eles ficaram observando o menino por um tempo e um dos moradores comentou com o patrão:
- Seu filho é bom de bola, Doutor.
- É. Ele leva jeito. Puxou o pai.
O patrão ficava envaidecido sempre que alguém elogiava o menino. Sabia de suas qualidades, e se sentia responsável pelas mesmas como se fossem próprias. Costumava dizer que criá-lo era sua responsabilidade, portanto, se saísse dali um bom homem, se daria por satisfeito. Ver aquele menino, já com quase 13 anos, se tornar um rapaz bom de bola, estudioso e namorador, o deixava muito feliz. Em ordem crescente de importância.
- O doutor podia deixar ele jogar no torneio das Aroeiras. Já é amanhã de tarde. - comentou um outro morador mais entusiasmado que tinha percebido o faro de gol do menino.
O pai virou pro menino e perguntou:
- Meu filho! O pessoal aqui tá lhe convidando pra jogar no torneio que vai ter nas Aroeiras amanhã. Você quer ir?
- Pra jogar por qual time, pai?
- Pelo Santos, claro!
Naquelas bandas do sertão a criatividade era guardada para os assuntos de sobrevivência (que eram muitos). Quando se tratava de nomes, valia o que havia de mais famoso. E a regra servia pra todo o tipo de coisa. De time de futebol a gente. A quantidade de Djon Leno, Maiquel Djequison, Stiven Spielberg, Valter Disney era uma coisa de louco! Até para os animais mais achegados sobrava um apelido mais importante: madona era a vaca premiada do curral. Dava mais de 8 litros de leite por dia. Rambo era o bode pai do chiqueiro. Zangado que só ele, encarava dezenas ao mesmo tempo e não sofria um arranhão sequer. Quando o assunto era time de futebol, a regra também valia. E se tinha um time que fez fama no mundo inteiro, esse era o Santos Futebol Clube. O time que parou guerra, correu o mundo mostrando um futebol arte e ainda fez nascer o Rei Pelé!
- Vou sim, pai! Posso ir no Nelson Piquet?
- Pode sim, meu filho, claro! Mas depois você banha ele no açude!
No dia seguinte, lá estava o garoto no ponto de bola. Chuteiras, meiões e caneleiras devidamente guardadas em uma pequena bolsa muito bem arrumada. Passara o dia anterior inteiro organizando tudo. Quando foi dormir, se deu conta que não tinha treinado o suficiente. Demorou pra pegar no sono. Acordou muito cedo e começou a treinar. Treinou tanto que cansou. Dormiu novamente e acordou com o pai no pé da rede.
- Num vai mais pro jogo não? O Nelson Piquet tá selado e o Alin tá te esperando pra ir contigo.
Alin era um amigo da fazenda. Irmão mais novo de um morador, era um pouco mais velho que o menino, mas com grande experiência. Uma espécie de protetor a quem o patrão confiava a guarda do seu filho. Na verdade Alin era seu segundo nome. O nome completo era Murramadi Alin da Silva Sousa.
O menino lavou o rosto, vestiu-se rápido, pulou o peitoril, montou no Piquet e já estava saindo quando lembrou-se de se despedir do pai. Olhou pra trás e viu o velho em pé, com sua bolsa na mão e uma cara de reprovação. Na afobação tinha se esquecido de pegar suas coisas.
- Olhe lá, hein!?!
Era o suficiente para o menino saber que tinha que tomar cuidado com tudo e com todos. Naquelas bandas e naquele tempo, pouca coisa era motivo pra discussão e briga. O menino, como filho do patrão, era respeitado. A preocupação do seu pai era pra que ele respeitasse os outros. Sabia que ninguém mexeria com o menino, mas temia que ele se zangasse com alguém. Era valente, paquerador e inexperiente, ou seja, um perigo.
Eles partiram. O menino no Nelson Piquet. O Alin numa égua mansa de nome pouco comum por aquelas bandas: Sarita. Muitos se perguntavam quem era essa dona. O patrão sempre desconversava. Dizia que era uma história longa...
Nelson Piquet era o cavalo prendado da fazenda. Mistura de Manga Larga
com "pé duro". Puxara mais o lado da raça, segundo o patrão. Era quase
puro. Esse nome, claro, se devia a velocidade que o animal alcançava e,
óbvio, ao seu temperamento nada amistoso.
O menino, no entanto, estava acostumado com o cavalo. Montava desde muito novo e eles tinham uma relação muito peculiar. Se entendiam no olhar. O menino era um dos poucos que Piquet permitia montar, fora o patrão e uns dois ou três empregados mais próximos da fazenda. Era um cavalo valente. Tal qual o menino.
A conversa fluiu enquanto os dois seguiam pras Aroeiras. Terra de mulher bonita e namoradeira. O menino vez por outra pedia pro pai pra ir pros terreiros alegres de lá. Era certo uma namorada nova. Talvez duas. Mas torneio era a primeira vez.
- Será que vai ter menina assistindo?
- Acho difícil! Normalmente só vai o macharal! - desiludiu Alin.
Ao chegarem lá o torneio já tinha começado. Eram quatro times que jogavam em sistema de semi-finais e final. Os jogos eram decididos por sorteio e jogados em dois tempos de 20 minutos. Em caso de empate. Pênaltis. O campeão levava o troféu e a bola.
Era mais do que suficiente pra chover marmanjo querendo jogar, afinal, por aquelas bandas era difícil uma diversão tão intensa. Fora as bodegas com sinuca e um ou outro terreiro alegre, os torneios de futebol eram a diversão que eles tinham! E principalmente pois juntavam várias meninas na beira do campo pra assistir. Eram várias! Menos interessadas no jogo que nos jogadores. O menino quase chorou de alegria quando viu a ruma de mulher ao redor do campo.
- Tu me disse que só ia ter homem, cara! Tá vendo a quantidade de mulher? Olha ali! Olha ali!
- Ou eu te dizia isso ou tu num ia me deixar em paz perguntando quem é que viria. - respondeu Alin satisfeito por ter enganado o amigo.
- Eita, cara!
O menino parecia pinto na merda. Não sabia por onde começar. Tratou de amarrar o cavalo numa árvore e foi logo chegando perto de um grupo de meninas. Conhecia algumas delas dos forrós. Puxou assunto. Quanto tá o jogo? Tão torcendo pra quem? Chegaram que horas? Vão embora com quem? A conversa corria solta quando uma das meninas perguntou curiosa:
- Tu num vai jogar não? O Santos já vai entrar em campo!
O menino tinha se esquecido do jogo! Olhou pro outro lado do campo e lá estavam todos com o uniforme semi novo que seu pai tinha dado há alguns meses! Iam jogar sem ele! Despediu-se das meninas meio que contrariado. Era uma escolha difícil, mas naquele momento ele queria jogar!
Deu a volta no campo correndo e chegou pro treinador, que também era o dono do time.
- Seu Clodoaldo, eu quero jogar!
- Você entra no segundo tempo. Vamos ver primeiro como começa o jogo pois o outro time é muito forte.
O outro time era o Real Madri. Formado por moradores da região da Miraíma. Eram conhecidos por serem raçudos e desleais. Clodoaldo, na verdade, estava preocupado com o menino. Era amigo de seu pai e sabia que uma entrada mais dura quebraria o moleque ao meio. Tratou de esperar.
De fato o jogo foi difícil. O primeiro tempo acabou em zero a zero e Clodoaldo chamou o menino no canto e explicou:
- Olhe, sei que você é bom de bola, mas a gente não pode perder esse torneio. Se a gente fizer um gol ai você entra, certo?
- Tudo bem seu Clodoaldo, pode deixar.
Pro menino, na verdade, as coisas não estavam tão mal. As meninas tinham vindo pra esse lado do campo pra puxar conversa. Naquele momento o banco de reservas estava mais interessante que o jogo.
O segundo tempo também acabou zero a zero. Pênaltis! Se do lado deles tinham jogadores raçudos, no time do Santos tinha um goleirão de primeira!
Marco Aurélio era filho de um professor de História de Santana do Acaraú que homenageara seus filhos com nomes de grandes figuras históricas. Eram sete! Júlio César, Aristóteles, Joana D`arc, e Marco Aurélio eram os que o menino conhecia. Deles, esse último era o mais alto e forte. Pegava bola como poucos! Vez por outra aparecia pela fazenda pra comprar queijo e brincava um pouco com o menino.
Não deu outra. Marco Aurélio pegou três pênaltis e o Santos foi pra final do torneio! Ia enfrentar o Atlético. Time formado pelo próprio pessoal das Aroeiras. Jogavam em casa e não iriam deixar passar esse torneio. Ia ser jogão!
Houve um intervalo de meia hora pros jogadores do Santos descansarem. O menino aproveitou pra arrastar uma das meninas pro canto. Era rápido e certeiro no gatilho. Beijos muitos. Naquela idade já pensava em outras coisas, mas não avançava sinal. Era muito novo para aquilo...
O jogo começou sem o menino, que voltou pro banco nos primeiros minutos do primeiro tempo. Estava tão contente que nem percebeu que o Santos estava perdendo. Só se deu conta quando Clodoaldo esbravejou ao seu lado, quase lhe derrubando de um susto.
- Porra, toca essa bola direito! Volta pra marcar, volta, volta!!!
O jogo estava tenso. E piorou mais quando o Atlético fez o segundo gol. Mais uma vez o ataque do Santos tinha perdido um gol feito. No rebote, o Atlético puxou um contra ataque mortal. 2 a 0.
No intervalo, a discussão foi das grandes! Vários jogadores falando e gritando uns com os outros. Eram muitos erros, o time estava perdendo muitos gols. O jogo já podia se considerar praticamente definido.
Clodoaldo resolveu então mudar meio time, alegando que estavam cansados. Era a chance do menino, que começou logo a se alongar. O técnico olhou pra ele e perguntou:
- Tu acha que dá pra jogar?
- Ora, mas é tudo que eu quero. Manda por a bola em mim que eu defino!
Diante disso, não tinha mais como evitar que o menino entrasse em campo. Era de longe o mais novo dos jogadores. A maioria já era adulto e tinha grande experiência de jogo. Ao verem aquele menino em campo, o time do Atlético achou que era piada.
- Ah bom! Tão dando o jogo por perdido! - esbravejou um dos jogadores.
Começou o segundo tempo e no primeiro lance de ataque do Santos a bola sobrou na frente do menino. Ele não contou pipoca. Chutou forte e viu a bola tomar o rumo certeiro do canto direito do banco de reservas do Atlético, que ficava atrás do gol, mas quase na lateral do campo. A gargalhada foi geral!
- Isso na serra vale ouro!!!
- Pra derrubar manga do pé é uma beleza!!!
O menino ficou furioso. Olhou em volta pra ver quem tinha dito aquilo. Em vão. Sua raiva era tanta que nem percebeu quando a lateral foi batida e a bola sobrou de novo na sua frente. Dessa vez nem chute, nem bola pra fora. Ele tinha esquecido do jogo. A bola passou entre suas pernas e ia sobrar pro zagueiro do Atlético, não fosse um lateral do Santos que apareceu no ataque e chutou certeiro no gol!
Com os gritos da torcida o menino acordou pro jogo. Ficou meio sem jeito por ter se desligado, mas voltou a sorrir quando o lateral lhe abraçou dizendo:
- Poxa cara, que porta-luz de craque!
Sem perceber o menino tinha feito uma jogada de mestre! Olhou pra Clodoaldo e viu o técnico aplaudir de pé a jogada! Olhou pras meninas e estavam todas pulando e vibrando de alegria. Ele era o craque do jogo!
A partida seguiu sem muitos lances perigosos. Como estava 2 a 1, o time do Atlético começou a praticar o que se chama de anti-jogo. Bola pro mato todo o tempo. Depois da jogada que fez, a marcação em cima do menino ficou mais forte. Poucas vezes conseguiu pegar na bola e, quando pegava, tinha que ser rápido se não já chegava um brutamontes pra lhe cutucar o tornozelo. Estava com raiva de novo. Prometeu a si mesmo que na próxima entrada ia deixar o cotovelo. E assim o fez. Uma cotovelada certeira que abriu o supercílio do volante atleticano. O juiz parou o jogo e deu amarelo pro menino que era protegido pelos seus colegas enquanto os jogadores do Atlético vinham tirar satisfação. O menino gritava:
- Ele que pediu. Aqui quem chegar leva!
De fora do campo, Alin estava quase tendo uma embolia. Não sabia se entrava em campo pra segurar o menino ou se fugia dali pra fingir que não estava vendo aquilo. Resolveu entrar, afinal, era seu amigo. Segurou o menino e disse:
- Tu tá ficando doido, cara! Se teu pai sabe disso ele te mata!
O menino lembrou do pai e do quanto ele zelava pela amizade daquela gente do sertão. Lembrou que todos ali eram pessoas de bem, trabalhadoras, honestas e que estavam todos lá pra se divertir. Sentiu-se mal com a confusão que provocara. Olhou pros jogadores do Atlético e pediu desculpas.
- Foi mal ai, pessoal. Fiquei meio sem cabeça. Me desculpem, tá bom? Vamos se divertir no jogo que é melhor.
Ouviu alguns palavrões, mas aos poucos os ânimos foram se acalmando. Não fosse ele o filho do patrão, iria levar uns belos cocorotes naquele fim de tarde, mas a realidade era aquela e todos respeitaram o menino por conta do seu pai. Enfaixaram o rosto do volante com gase e algodão e o sangramento parou. Estavam prontos de novo!
Finalmente o jogo recomeçou. Restavam menos de 5 minutos para o final e o Santos tinha que, pelo menos, empatar a partida. O Atlético, ao contrário do que vinha fazendo antes, resolveu jogar bola, queria ampliar a vantagem, era uma forma de se vingar do menino.
Numa jogada maestral, o lateral direito do Atlético invadiu a área driblando três do time do Santos, passou pelo goleiro e chutou para o gol livre. A bola correu cautelosamente até tocar a trave e voltar para o zagueiro do Santos que deu um chutão pro ataque.
A torcida ainda se lamentava quando o menino matou a bola chutada com uma categoria impressionante, correndo livre em direção ao goleiro que aguardava na entrada da área com atenção. A torcida gritava eufórica! Seria o gol de empate! O menino fez que ia pra direita, passou o pé por cima da bola e puxou pra esquerda. O goleiro caiu sentado. O menino parou a bola em cima da linha, virou de costas pro gol e fez de calcanhar! Gol de placa no campo das Aroeiras! Era o gol de empate do Santos que agora tinha um novo craque e herói! Os jogadores correram eufóricos pra abraçar aquele garoto invocado.
Agora faltavam menos de 2 minutos de jogo. Era só segurar o resultado. O empate estava de bom tamanho. Nos pênaltis o Santos tinha o goleirão Marco Aurélio. Era vitória certa. Numa última tentativa, o time do Atlético subiu inteiro pro ataque, a bola foi cruzada na área. Cabeças voavam alto tentando alcançá-la. Em vão. Ninguém conseguiu cabecear e numa dessas ironias do destino aquela bola acabou passando por todos e morrendo dentro do gol do Santos.
A histeria foi geral! O Atlético conseguira o gol da vitória e do título, pois o juiz tratou logo de encerrar a partida imaginando alguma confusão, afinal, era o time da casa que estava vencendo.
Os torcedores e o time do Santos saíram aplaudidos. O menino, mesmo depois das confusões, foi saudado e parabenizado por todos, inclusive pelos adversários. Estava feliz. Aquilo lhe surpreendia, pois era conhecido por não se comportar bem em momentos de derrota. Não sabia perder, ao menos até então.
Ficaram por ali por mais algum tempo. O menino terminando o chamego que começara antes do jogo. Agora mais quente e aconchegante que antes, afinal, ele era um craque e aquilo atraía muito mais as meninas.
Já era noite quando Alin lhe chamou para voltarem pra casa. Se despediram de todos e partiram em seus cavalos. O amigo começou a conversa:
- Rapaz, tu jogou bem demais! Pena que perderam né? Tu deve ter ficado com ódio!
- Pior que não, cara! Mesmo na derrota eu saí vitorioso, pois dei o melhor de mim e sei que fiz o que pude. Na verdade, nessa vida, o que importa é a gente fazer a coisa certa. A vitória nem sempre virá, mas se a gente fizer o que se deve, com certeza perderemos de cabeça erguida.
Alin ficou pensativo. Nunca tinha ouvido o amigo falar tão correto e tão bonito. De alguma forma, não sabe como, aquele jogo tinha servido pra dar uma grande lição ao menino.
E dizem que, a partir de então, o menino virou moço...
terça-feira, 20 de novembro de 2012
Vivendo de Esperança
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O
olhar perdido já era costumeiro. Luiz acordava, tomava um caneco d'água, lavava o
rosto, saia pro alpendre e ficava com o olhar distante no nascente.
A
esperança em dias melhores era mais forte que a tentação de migrar para a
cidade. Muitos já foram, com a promessa de voltar quando tudo melhorasse.
Luiz
ficara. Suas raízes na terra quente e seca eram mais fortes que a fome e a
sede. Sua fé no inverno vindouro e próximo falava mais alto que o medo. Sua
esperança de que sua vida voltasse a ser como antes era maior que tudo.
Já
estava no final do mês de novembro e, aos poucos, começava a fazer suas
experiências. Eram muitas e nem todas tinham sua lógica, mas pro coração do
sertanejo, tudo era sinônimo de esperança.
Torcia
para que não chovesse naquele mês, afinal, chuva em novembro era sinal de
inverno desmantelado. Sempre foi assim, inclusive nos dois anos anteriores.
Choveu bastante em novembro e deu no que deu: seca. Por isso, naquele momento o
olhar perdido pedia mais por sol do que por chuva. Queria um inverno bom e com
chuva farta, mas não agora.
Em
dezembro, logo no dia 13, faria a experiência de Santa Luzia. Colocaria, na
noite do dia anterior, uma pedra sobre o peitoril, com sete riscos de tamanho
idênticos e, entre esses riscos, uma pedra de sal. Cada pedra representava um
mês do ano seguinte. No outro dia, bastava observar o sal e ver quais estavam
umedecidos. Era a chuva dos meses de janeiro a junho. A experiência do ano
passado não tinha falhado. Desde logo soube do sofrimento que enfrentaria. Não
tinha uma pedra sequer que tivesse ficado mais molhadinha.
Seu
compadre e vizinho também tinha feito a experiência no ano anterior e tinha
tido um resultado curioso. Segundo ele, o inverno ia ser dos melhores, pois as
pedras amanheceram derretidas em água. Ninguém entendeu. Vários conhecidos
foram ver o feito, sem acreditar na possibilidade. Muitos queriam crer que
todos estavam errados, menos ele. Logo, porém, foi descoberto o erro. O velho
sertanejo tinha colocado a pedra com o sal em cima de uma cisterna. Lugar mais
úmido não havia num raio de quilômetros. Uma pena.
De
fato, aquela experiência não falhava. Luiz fazia essas e outras sempre que
podia. Gostava de observar a natureza e, observando, meio que planejava sua
vida. Era só terminar o mês de novembro sem chuva que iria começar a roçar. Ia
usar o mesmo roçado dos dois anos anteriores. Estava limpo ainda, bastava uma
sacodida na terra e a retirada de uns poucos galhos secos que insistiram em
crescer em meio à seca.
Nos
anos anteriores limpara, mas não plantara. Tinha economizado, aos menos,
aqueles grãos. Tinha muita fé na chuva, mas sabia que se as experiências dessem
errado, nem adiantava teimar. Nunca, em quase quarenta anos de vida adulta,
tinha perdido uma previsão. Se a natureza dizia que ia ser seca, nem plantava.
Se mostrava que ia ter chuva, roçava, plantava e colhia farto.
Só
teve um ano em que sua previsão não foi das mais acertadas. Naquele ano de 97 o
inverno começara bom. Logo em dezembro vieram as primeiras trovoadas. Muitos se
apressaram. Ele esperou por janeiro. Plantou e viu seu roçado crescer vistoso.
O inverno parecia perfeito, mas no dia de São José, veio o que ninguém
esperava. Chuva desde a madrugada. Era um péssimo sinal.
O
dia de São José ocorre no dia 19 de março, 48 horas antes do equinócio e tinha
pra Luiz um significado todo especial. Se até aquela data o inverno não se
manifestasse, considerava perdidas todas as esperanças. Mas esse dia também tinha
suas mensagens. Ele tinha que amanhecer com o céu limpo, com sol. Chuva somente
a tarde. Se amanhecesse chovendo, era sinal de inverno findando. Era o que se
chamava de seca verde. Chovia, mas não o suficiente para encher os açudes.
Naquele
ano de 97 o dia de São José amanheceu inundado por chuva em todo o sertão. Era
o prenúncio de um desastre. E ele não tardou a acontecer. Luiz perdeu toda a
lavoura. O grãos que estavam por vir não vingaram. teve que arrendar sua
plantação pra um vizinho que tinha um gado farto. O que ia lhe tirar a fome,
serviu pra alimentar o gado alheio.
Jamais
esquecera daquele ano. Enquanto olhava o horizonte, torcendo pra não vir chuva
em novembro, Luiz lembrava-se com tristeza daquele ano de 97, ano em que perdera
quase tudo. Perdera o plantio, perdera tempo, trabalho, mas também perdera sua
Mocinha.
Já
se passavam 15 anos, mas não tinha um só dia que ele não lembrasse de seu
cheiro. Sua parceira de toda a vida tinha lhe deixado sozinho, sem filhos, sem
ninguém.
Casaram
muito novos. Luiz, filho mais velho de um antigo latifundiário da região,
tratou logo de ganhar um pedacinho de terra. Mocinha, ou Dona Mocinha como
passou a ser chamada, era a moça mais linda da região. Filha de uma cabocla com
um imigrante holandês, que andou por aquelas bandas nos primórdios dos anos 50
em busca de aventuras. Dona Mocinha herdara a beleza do pai e a sensualidade da
mãe. Tinha lindos cabelos castanhos claros, pele morena e olhos da cor do
inverno, como gostava de dizer Luiz. Verdes como gosta o sertanejo.
Casaram
e foram morar juntos. Nunca tiveram filhos. Não se sabe se por problemas de
Luiz ou de Dona Mocinha, a verdade é que nunca conseguiram, embora sempre
desejassem. Principalmente Mocinha que sempre quisera uma família grande e
farta. Daquelas que enche uma casa. Sonhava com isso desde criança, pois nunca
teve irmãos e viveu por muitos anos sozinha com sua mãe.
Mas
quis o destino que os dois morassem sós, por quase três décadas. Foram anos de
muita luta, trabalho, mas também de muito amor, cumplicidade, amizade,
esperança, até que um dia Deus resolveu levar Mocinha.
Luiz
olhava o horizonte e sentia o cheiro de café quente que ela fazia toda manhã.
Ele acordava antes do amanhecer pra juntar o gado e tirar o leite. Quando
voltava, encontrava aquele café quentinho, com cheiro de aconchego. Encostava
no peitoril e tomava o café olhando o horizonte enquanto Mocinha lhe olhava,
apaixonada.
Estava
exatamente ali, no peitoril, olhando o horizonte. Só que sem o café, sem sua Mocinha.
Não
se sabe ao certo o que a levou. O que se sabe é que foi rápido. Muito rápido.
Um dia ela sentiu dores na cabeça, levaram num médico da cidade que lhe
receitou uns exames. Em vão. Morrera a caminho de casa, subitamente.
Desde
então Luiz tem vivido só. Nunca pensou em mais ninguém. Nem quer. O pensamento
de que sua Mocinha ainda vive e convive com ele é algo que trás no pensamento,
quase como um delírio. Imagina ela ao seu lado na cama, sentada à mesa, durante
o almoço. Inclusive ali, no peitoril, olhando o horizonte. Imagina ela ao seu
lado, lhe olhando, admirando seu olhar perdido e esperançoso. Esperançoso por
chuva, rios e açudes cheios, mesa farta, crianças correndo pela casa, cantigas
de ninar...filhos que nunca tiveram mas que também vivem em seus pensamentos...
E
assim Luiz vai vivendo de esperança. Esperança de que tudo reviva pra ele.
Esperança em ver sua Mocinha de novo. De poder segurar sua mão enquanto observa
o tempo subindo, as nuvens formando e a chuva chegando. Aquele cheiro de terra
molhada, misturado ao cheiro de seus cabelos cor de mel. O banho de chuva em
seus braços. Olha pro horizonte e espera, dia após dia, sozinho, sem perder a
fé...
terça-feira, 13 de novembro de 2012
O valor do sertão pro sertanejo
A vida no sertão nem sempre é difícil. Mesmo os mais desafortunados dos sertanejos têm seus relances de alegria e contentamento.
Fialho era o filho mais novo de um casal de sertanejos à moda antiga. Desses que se recusavam a aceitar a chegada da modernidade de uma forma muitas vezes agressiva. Achavam que bom mesmo era viver na simplicidade. Tudo que era moderno era ruim. Contaminava.
Certa vez Fialho comprou um rádio de pilhas. Gostava de ouvir músicas e, como em sua casa não tinha energia elétrica, sempre tinha que ir pra casa dos amigos se socorrer. Eles já tinham até televisão. Na casa de Fialho, nem se falava do assunto.
Chegou em casa todo espilicute com a nova aquisição. Juntava seu dinheiro há meses, ganhado a duras penas nas diárias que dava pro patrão. Ajudava sempre em casa, mas tirava um pouco do que ganhava pra cachaça. Outro pouco guardava pra comprar alguma roupa ou quem sabe pagar uma passagem até Sobral. Lá tinha de tudo. Numas dessas viagens, resolveu comprar o micro-sistem, ou "minisisti" como chamava.
Entrou em casa e deixou o equipamento no seu quartinho. Ainda não tinha comprado as pilhas, logo, não poderia usá-lo. Só dali há algumas semanas quando juntaria dinheiro suficiente.
Guardou e não contou a ninguém. Seus pais já eram bem velhos e, com o hábitos rígidos, demorariam a se adaptar àquela caixa falante. Era melhor prepará-los antes, para que se acontumassem com a ideia e depois permitissem que ele usasse o aparelho. A rigidez de seus pais era tamanha que todos os irmãos e irmãs mais velhos de Fialho já tinham saído de casa. Uns por causas natuais, como casamento ou morte. Outros por não suportarem viver em tamanho isolamento. Queriam ver TV, queria uma geladeira, ouvir música. Mais recentemente um de seus irmãos comprou um aparelho celular que pega na varanda da casa dele. É só ficar em pé em cima do peitoril, olhando pro poente e encostar o braço no pé de castanhola que tem do lado. Pronto! O sinal é quase bom!
Mas Fialho não tinha nada disso. Até então, pensava ele. Como filho mais novo, os pais haveriam de abrir uma exceção e lhe permitir o direito de ouvir seus forrós com tranquilidade. Baixinho. Não assustaria ninguém!
Guardou o som e foi trabalhar, feliz. Dali alguns dias teria o que tanto queria.
Ao retornar, já ao entardecer, percebeu algo diferente em seu pai. Ele estava sentado na calçada, como sempre ficava, mas dessa vez seu olhar era de alegria e contentamento. Muito diferente do olhar sério, mas sereno, de sempre.
Pediu a bênção e ia entrando, quando seu pai perguntou:
- Cê sabe dizerde quem era aquele negócio que toca música que tava lá no seu quarto?
- É meu, painho. Comprei hoje de manhã na feira de Sobral. O Senhor viu, foi?
- Se vi! Seu tio Chico veio deixar uma saca de milho e encontrou o bicho. Botou uns negócios dentro e ele começou a tocar uns chachado! Gostei tanto que vendi pra ele!
- Cê vendeu, meu pai? Mas era meu! - disse o filho desesperado!
- Oxente, menino! Tá aqui o dinheiro - falou estendendo a mão e entregando quase o dobro do que Fialho tinha pago pelo aparelho!
- Mas painho! Aqui tem muito! Tio Chico vai ficar chateado quando souber o preço certo.
- Fica não, meu filho. No sertão as coisas da cidade valem mais. Na cidade, as coisas do sertão vale menos. Por isso que só tenho coisas nossas. Só eu sei o valor do que tenho.
Fialho entrou refletindo sobre o que ouvira.
O velho sorriu feliz.
domingo, 11 de novembro de 2012
PIB - Perfeito Idiota Brasileiro
PIB. Chamemos de PIB. O Perfeito Idiota Brasileiro.
Vamos descrever o dia do PIB. Vinte e quatro horas na
vida de um PIB para que os pósteros, a posteridade, tenham uma idéia do Brasil
de 2012.
Ele acorda às sete horas da manhã. Tem que preparar o
próprio café da manhã. Já faz alguns anos que sua mulher parou de fazer isso
para ele, e ficou caro demais para ele pagar uma empregada doméstica.
Ele lamenta isso. Era bom quando havia uma
multidão de nordestinas sem instrução nenhuma que saíam de suas cidades por
falta de perspectiva e iam dar no Sul, onde acabavam virando domésticas.
PIB dá um suspiro de saudade. Chegou a ter uma
faxineira e uma cozinheira nos velhos e bons tempos. Num certo momento, PIB
percebeu que as coisas começaram a ficar mais difíceis. Havia menos mulheres
dispostas a trabalhar como domésticas, e os salários foram ficando absurdos.
Para piorar ainda mais as coisas, ao contrário do que
sempre acontecera, a última empregada de PIB recusou votar no candidato que ele
indicou.
Mulherzinha metida.
Foi por coisas assim que PIB aderiu ao movimento
Cansei, ao lado de ativistas notáveis como Boris Casoy, Hebe Camargo,
Agnaldo Rayol e João Dória Júnior. Empolgante o Cansei. PIB quase fora a uma
manifestação. Só desistiu porque era sábado e sábado a feijoada era sagrada. O
protesto com certeza fora um sucesso.
O povo unido jamais será vencido.
PIB tomou o café na cozinha, com o Globo nas mãos.
Assinava o jornal fazia muitos anos. Se todos os brasileiros fossem como o
Doutor Roberto Marinho, PIB pensou, hoje seríamos os Estados Unidos. Bonito o
choro do Bonner ao anunciar no Jornal Nacional a morte de Roberto Marinho.
Por que ainda não ergueram estátuas para ele?
Com o Globo, PIB iniciou sua sessão de leituras
matinais. Mais ou menos quarenta minutos, antes de ir para o escritório.
Leu Merval. Quer dizer, leu o primeiro parágrafo e
mais o título porque naquele dia o texto, embora magnífico, estava longo
demais. Havia um artigo de Ali Kamel. “Um cabeça”, pensou PIB. “Deve ter o QI
do Einstein.” Mas também aquele artigo –embora brilhante, um tratado perfeito
sobre o assistencialismo ou talvez sobre o absurdo das cotas, PIB já não sabia
precisar — parecia um pouco mais comprido do que o habitual. Deixou para
terminar a leitura à noite.
PIB vibrou porque, se não bastassem Merval e Kamel,
havia ainda Jabor.
Um gênio. Largou o cinema para iluminar o Brasil com
sua prosa espetacular. Um verdadeiro santo. Podia estar com a sala da casa
cheia de Oscar.
Começou a ler Jabor e refletiu. “Impressão minha ou
hoje aumentaram o tamanho do Jabor?” PIB sacudiu a cabeça, na solidão da
cozinha, num gesto de reverência extrema por Jabor, mas também achou melhor
deixar para ler mais tarde. Era seu dia de sorte. Também o historiador Marco
Antônio Villa estava no Globo. “Os primeiros 18 meses do governo Dilma foram
fracassos sobre fracassos” era a primeira linha. Bastava. Villa sempre
surpreendia com pensamentos que fugiam do lugar comum.
Como uma terrorista chegou ao poder? Bem, tenho que
comprar algum livro de história do Villa. Ele com certeza escreveu vários.
Completou a sessão de leituras da manhã na internet.
Leu Reinaldo Azevedo. Quer dizer, naquela manhã, leu um parágrafo. Na
verdade, metade. Menos. O título. Não importava. Azevedo era capaz de
mesmerizar toda uma nação com a luz cintilante de meia dúzia entre milhares de
linhas que produzia incessantemente. PIB deixava escapar um sorriso de
admiração a cada vez que li a palavra “petralha” em Azevedo.
Rei é rei. Um cabeça pensante. Por que será que não
ocorreu a nenhum presidente da República contratar esse homem como assessor
especial? Se o Brasil bobear, a Casa Branca vem e contrata.
Debate é assim.Medalhinha. Chamar um tal de Nassif de
Nassífilis. PIB julgava FHC um banana. Não sabia debater. Bananão. Como FHC
podia dizer coisas assim? “Eu não estou aqui para ver o PT se arrebentar. O
Brasil precisa de partidos que tenham uma certa história, e o PT tem.” Isso em
2005, quando era o momento de derrubar o lulopetismo. E essa outra? “Por que o
mensalão se tornou conhecido? Porque o Roberto Jefferson teatralizou o
mensalão.” E essa então? “O Lula, ao invés de renunciar e desistir, disse: eu
vou brigar. O Lula foi decisivo naquele momento, em dissipar o mensalão.”
Ba-na-não! Graças a Deus já passou dos 80 e não pode
mais atrapalhar o Brasil. O campo ficou livre para o Serra e o Aécio!
Ainda na internet, uma passagem pelo Blog do Noblat.
Naquele dia, no blog havia uma coluna assinada por Demóstenes. PIB deu parabéns
mentais a Noblat por abrir espaço a Demóstenes, nosso campeão mundial da
moralidade, nosso Catão. PIB guardara um texto de Demetrio Magnolli, outro
cérebro avançado, em que este prestava um justo tributo à nossa reserva moral
no senado. Saíra na edição das 100 pessoas mais influentes da revista Época.
Anotou um trecho: “Não é preciso concordar com tudo que ele fala ou faz para
homenageá-lo. Demósteneses não é mais um comerciante num mercado em que se
trafica influência em troca de cargos ou privilégios. Ele tem princípios e
convicções.”
Por que falam tanto do tal do Assange e do Wikileaks
quando temos tantos caras muito melhores?
A caminho do trabalho, PIB ligou na CBN. Ouviu uma
entrevista com o filósofo Luiz Felipe Pondé. “Meu pequeno carro não contribui
para o aquecimento do planeta”, disse Pondé, o nosso Sócrates, o Aristóteles
verde-amarelo. Pondé ganhara imediatamente a admiração de PIB quando reclamara
dos pobres que estavam congestionando os aeroportos. A última vez que viajara
para Miami ficara revoltado com as pessoas inferiores que iam voar.
Bem, preciso anotar aquela. Meu pequeno carro não
contribui para o aquecimento global.
Isso o levou a reparar nos ciclistas nas ruas de São
Paulo. Cada dia parecia haver mais. Mau sinal. Havia muitas bicicletas no
trajeto. PIB sentiu vontade de atropelá-las em grupo e fazer um strike.
Odiava ciclistas. Atrapalhavam os motoristas. Tivera vontade de vomitar quando
vira a foto de um ciclista inglês de bunda de fora — branca e mole como um
pudim — numa marcha nudista por mais espaço e segurança em Londres para
as bicicletas.
Abria uma única exceção: Soninha. Desde que ela
continuasse a posar pelada em nome das bicicletas.
Hahaha. Hohoho.
Na CBN ouviu também informações e comentários sobre o
mundo. “Prestígio em Paris dá vantagem a Sarkozy nas eleições presidenciais”, a
CBN avisou. PIB admirava Sarkozy. Proibir a burca foi um gesto histórico. As
muçulmanas deveriam ser gratas a Sarkozy. Elas haveriam de votar maciçamente
nele para dar a ele o segundo mandato para o qual a CBN dizia que ele era o
favorito.
Os maridos obrigam as coitadas a usar burca.
O tema do islamismo estava ainda em sua mente quando
se instalou em seu cubículo de gerente na empresa. PIB refletiu sobre o mundo.
Tinha lido em algum lugar que no Afeganistão as pessoas queriam que os soldados
americanos fossem embora. Os afegãos estavam queimando bandeiras dos
Estados Unidos. A mesma coisa estava ocorrendo no Iraque. E no Iêmen. Em todo o
Oriente Médio, fora Israel.
Ingratos. Como eles não percebem que os Estados Unidos
estão lá para promover a democracia e levar a civilização? Os americanos estão
acima de interesses mesquinhos por coisas como o petróleo.
Era um perigo o avanço muçulmano. Não que apoiasse,
mas PIB entendia o norueguês que matara 77 pessoas por considerar que o governo
de seu país era leniente demais com os muçulmanos.
A raça branca está em perigo.
Entretido em salvar a raça branca, PIB não percebeu o
tempo passar. Só notou pela fome que já era hora de comer. A opção, mais uma
vez, foi pelo Big Mac do shopping, e mais a Coca dupla. Detestava os ativistas
dos direitos dos animais porque combatiam os Big Macs. PIB estava tecnicamente
obeso, mas na semana que vem iniciaria uma dieta e começaria também a se
exercitar.
Fim do expediente. A estagiária estava com um decote
particularmente ousado. Talvez estivesse sem sutiã. PIB a chamou algumas vezes
para discutir assuntos que na verdade não tinham por que ser discutidos. A
questão era olhá-la. Valeu o dia, refletiu. Home office é uma bobagem
porque não permite esse tipo de coisa: olhar para meninas gostosas no
escritório.
Na volta, mais uma vez foi tomado pela tentação de atropelar
os ciclistas. “Quando você deseja muito uma coisa, todo o universo conspira a
seu favor”. PIB se lembrou da frase de seu escritor favorito, Paulo Coelho.
Então ele desejou muito que as bicicletas sumissem.
Xiitas.
Algum colunista escrevera isso sobre os ciclistas. PIB
não lembrava quem era, mas concordava inteiramente. Os ciclistas são gente
esquisita que deve fazer ioga e praticar meditação, suspeitava PIB.
Tudo gay!
Já incorporara para si mesmo a frase genial de Pondé.
Meu carro pequeno não contribui para o aquecimento
global.
No churrasco de domingo, ia soltar essa. Teve um breve
lapso de inquietação quando se deu conta de que os brasileiros que tanto
contribuíam para a elevação do pensamento nacional já não eram tão novos assim,
O próprio Merval era imortal apenas pela sua contribuição às letras,
reconhecida pela Academia. Então lhe veio à cabeça a juventude sábia e
influente de Luciano Huck, e ficou mais sossegado.
A mulher não percebeu quando ele chegou. Não era culpa
dela. A televisão estava ligada com som alto na novela da Globo. PIB lera
várias vezes que as novelas tinham uma “missão civilizadora” no Brasil. Mais
uma dívida dos brasileiros perante Roberto Marinho: a perpetuação das novelas
cvilizadoras. A mídia impressa brasileira reconhecia a missão civilizadora
na forma de uma cobertura maravilhosa das novelas. Uma vez um leitor da Folha
reclamou por encontrar na Ilustrada seis artigos sobre novelas.
O brasileiro só sabe reclamar. E reivindicar. Uma
besta!
PIB deu um alô que não foi ouvido. Ou pensou ter dado.
Sentou ao lado da mulher, e o silêncio confirmou para ele sua tese: depois de
muitos anos de casamento as pessoas se entendem tão bem que não precisam trocar
uma só palavra. Nem se tocar. É quando o casamento chega ao estágio da
perfeição: ninguém tem que fazer nada. É o estágio superior em que o matrimônio
se santifica pela ausência do sexo. A cada quinze dias, PIB tomava Viagra e
descarregava as tensões sexuais com uma escorte que cobrava 400 reais.
Tá barato. Um dia ela topa beijar!
Não ligava muito para as novelas civiizadoras. Mas
soubera no escritório que Juliana Paes aparecia de vez em quando pelada. Passou
por sua cabeça um pensamento rápido.
Talvez eu devesse pedir para a patroa me avisar quando
a Juliana Paes ficar sem roupa.
Terminada a novela, era a sua vez na televisão.
Futebol. Bacana o futebol passar bem tarde, depois da novela. Provavelmente a
Globo pensara nisso para ajudar os pobres que moravam longe e demoravam horas
para chegar em casa depois do trabalho.
“Boa noite, amigos da Globo!”
A voz do Brasil se apresentou. “The voice”, pensou PIB
em inglês.
Um carisma total o Galvão. Subaproveitado. Devia estar
no Ministério da Economia, e não narrando escanteios e tiros de meta.
PIB lera que Galvão estava morando em Mônaco.
Sabichão. Ficava muito mais fácil, assim, cobrir a Fórmula 1. Nunca alguém da
estatura moral de Galvão optaria por Mônaco para não pagar imposto. Galvão
certamente faria bonito na Dança dos Famosos de seu amigo Fausto Silva, o
Faustão, outro civilizador, especulou PIB em sua mente criativa.
PIB não torcia a rigor para time nenhum. Era,
essencialmente, anticorintiano. Com seu segundo saco saco de pipocas na mão,
viu, contrariado, o Corinthians vencer.
Amanhã os boys vão estar insuportáveis.
PIB queria muito ver o Jô.
Era um final de dia perfeito, ainda mais porque antes
havia o aperitivo representado por William Waack. PIB achava um privilegio
poder ver Waack não apenas na Globo como na Globonews. Os Marinhos podiam
cobrar pela Globonews, mas não faziam isso para proporcionar cultura de graça
aos brasileiros. PIB zapeava quando Waack dava suas lições na televisão, em
busca quem sabe de uma mulher pelada no horário tardio, mas os fragmentos que
pescava eram suficientes.
Jô. Não posso perder Jô. Uma enciclopédia. Podia ser
editorislista do Estadão. Hoje ele vai entrevistar o Mainardi!
Manhattan Connection era simplesmente obrigatório,
embora PIB o dividisse com vários outros enquanto manejava o controle remoto.
Outro dia PIB vira um cara que merecia atenção: Marcelo Madureira. Com
sua memória fotográfica, PIB instantaneamente o reconheceu: trabalhara como
humorista na Praça da Alegria. Ou na Zorra Total?
PIB bem que queria ver Jô. Ou pelo menos incluí-lo no
zapeamento. Duas palavras de Jô valiam por mil das pessoas normais. Faziam você
pensar e, além do mais, rir porque o cara tinha um estoque ilimitado de piadas.
Não vejo graça nenhuma no Woody Allen. Mas em
compensação o Jô!
Mas não foi possível ver o gordo que ensina e alegra
milhões de brasileiros.
PIB acabou dormindo no sofá, do qual sua mulher achou
preferível não o tirar, e onde ele roncou tão alto quanto o som da tevê — e
teve, como sempre, o sono límpido, impoluto, irreprochável dos perfeitos
idiotas.
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O PIB brasileiro está em franco crescimento
(infelizmente...).
Texto de Paulo Nogueira, retirado do site:
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