O português dos alunos de Direito vem se mostrando cada vez mais
deficiente. E não é privilégio desta ou daquela faculdade, pública ou
privada, nem mesmo de determinada região. É nacional. Frases
incompreensíveis, palavras utilizadas erroneamente, dificuldade extrema
em redigir um texto, impossibilidade de por no papel o que se pensa,
tudo isto vai se tornando rotina nas atividades dos estudantes da
graduação.
O fato não passa despercebido aos profissionais da
área. Professores comentam, as faculdades de Direito notam, escritórios
de advocacia e órgãos públicos alertam os estagiários, que por vezes são
mandados embora ou colocados em setores mais simples, onde não seja
necessário escrever.
A situação, que se agrava a cada ano, é
altamente negativa. Sofrem os estudantes, pois vislumbram as
dificuldades que terão na vida profissional, perdem os que os empregam,
porque o serviço que prestam não corresponde às expectativas, penam as
faculdades de Direito, inclusive pelos reflexos que se fazem sentir nos
exames da OAB, com o baixo nível de aprovação.
De quem é a responsabilidade? Que fazer?
O
primeiro passo é reconhecer que estamos diante de um momento de virada
cultural, de mudanças radicais. A começar pelo uso dos aparelhos
eletrônicos. Mensagens eletrônicas, torpedos nos celulares,
manifestações nas redes sociais, costumam ser curtas, diretas,
telegráficas. Mudam comportamentos, formas de expressão, regras de
conduta. Uma das consequências é a total alteração da forma de
comunicar-se por escrito, o que atinge um número significativo de
jovens.
Poucos com mais de 40 anos saberão o que significa a frase
“quer teclar comigo?”. Resposta: trocar mensagens. Mais difícil será
compreender que “sussi” é sossego e “blz” quer dizer beleza, tudo bem.
Dois pontos e um colchete :) significa feliz, mas dois pontos e um O :O
quer dizer surpresa, “beijaum” é um beijo grande. Estamos diante de uma
nova e diminuta linguagem, o internetês.
Além
disto, palavras estrangeiras são incluídas no vocabulário, por vezes
substituindo alguma do português (deletar, por apagar), em outras,
traduzidas indevidamente (inicializar ao invés de iniciar) ou mesmo
inovando por completo (p. ex., printar para dizer imprimir).
Socialmente,
o jovem que não se expressar desta forma estará excluído do grupo. Com
certeza ninguém jamais ouviu ou ouvirá uma jovem dizendo “estou louca para sair com ele, porque seu português é maravilhoso, fala e escreve muito bem”.
Em
um segundo plano, mas também de grande relevância, são as deficiências
do ensino médio e fundamental. Não é preciso ser um especialista para
saber que houve uma queda brusca no nível de ensino e que não se reprova
ninguém, principalmente nas escolas públicas. Segundo a mídia impressa
“A discreta melhora apresentada nos últimos anos no ensino médio público
cessou em 2011” (Folha de S.Paulo, 15.8.2012, C1).
Tudo
isto faz com que, ao entrar na Faculdade de Direito, o jovem acadêmico
tenha grande dificuldade em expressar-se, inclusive oralmente. O seu
vocabulário reduz-se a poucas palavras. Sem vocabulário não se expõem as
ideias, não se transmite o que se pensa. Daí porque surgem, nos
trabalhos acadêmicos, nos testes ou nos estágios, petições lacunosas ou
confusas. Ofício, carta, memorandum, nem pensar.
Não é
raro que o professor encontre parágrafos incompreensíveis, petições que
repetem a mesma coisa duas ou três vezes, ou referências que nada tem a
ver com o assunto tratado, porque foram copiadas por quem não consegue
escrever. Há uma mescla de mau português com dificuldade de organizar as
ideias.
Se esta situação não é boa para qualquer estudante
universitário, ela é ainda pior para o acadêmico de Direito. Sim, porque
nas profissões jurídicas a exposição de ideias, falando ou escrevendo, é
a imprescindível rotina de trabalho. Ao contrário, a importância será
menor, por exemplo, para um profissional de área técnica.
O
estudante de Direito deve procurar sair dessa situação. A regra número
um é ler, de preferência autores com redação clara, rica em sinônimos,
que organize bem suas ideias. Machado de Assis, por exemplo. O editorial
dos bons jornais também ajuda.
A segunda regra é escrever. Fugir
da cômoda repetição de textos alheios, do copia e cola, do uso absoluto
de modelos. Redigir é um excelente meio de aprimorar a escrita. Uma
folha por dia, sobre qualquer assunto, pedindo a alguém que leia e
corrija, pode gerar excelentes resultados. Escrever o que se pensa, na
ordem direta.
Por parte das faculdades de Direito também muito se
pode fazer. Em primeiro lugar, enfrentando o problema. Obviamente, elas
não são a causa, mas nem por isso deixam de sofrer as consequências. A
queda no nível, com a consequente reprovação em Exame da OAB e concursos
públicos, atinge a imagem do estabelecimento de ensino.
É preciso
que se inclua o português nos cursos de graduação, como matéria
obrigatória. No primeiro período e de preferência com um professor
rigoroso. Se a faculdade não quiser colocar com todas as letras que está
ensinando português, pode batizar a matéria com um nome mais pomposo
como “Análise de texto” ou “Princípios de redação”. E se houver
dificuldades com a grade horária, já que cinco anos não são suficientes
para tantas matérias, que pelo menos se ofereça um módulo, isto é, aulas
que se assistem por inscrição voluntária ou ainda curso a distância,
via internet.
Os professores devem auxiliar os estudantes, tendo
em mente que eles estão inseridos em um mundo novo, com regras próprias.
E também, na medida do possível, evitar provas objetivas, pois não
auxiliam na prática da redação. Provas orais também são importantes,
porque obrigam o aluno a saber expressar-se. É dizer, não basta
criticar, contar os erros encontrados nas provas. É preciso ajudar,
orientar.
Os órgãos que administram as carreiras públicas também
têm um papel a cumprir. Por exemplo, cursos de redação, presenciais ou a
distância, podem auxiliar os assessores dos agentes do Ministério
Público. Incluir o português nas provas de ingresso também é uma boa
providência (o TJ-SP inclui Língua Portuguesa nos concursos de ingresso
na magistratura). Colocar a matéria nos cursos que se ministram após a
posse no cargo também é importante.
Em suma, o problema aí está e é
preciso enfrentá-lo. E os estudantes necessitam ter em mente que, mesmo
neste novo mundo, ele sempre exigirá do profissional do Direito clareza
de ideias e eficiência na exposição das teses.
Fonte: http://www.conjur.com.br/2012-ago-19/segunda-leitura-portugues-redacao-alunos-direito
MINHA OPINIÃO
Quem já foi meu aluno sabe o quanto tento fomentar a leitura e o hábito da escrita em sala de aula. A importância de saber escrever e falar com qualidade é imprescindível a um bom profissional do direito, em qualquer área de atuação.
Ao operador do direito caberá, mais do que em qualquer outra área profissional, dominar técnicas de argumentação e fundamentação que, somadas, formam o raciocínio lógico-jurídico.
Que essa deficiência consiga ser corrigida em nossos alunos, que no caso específico da UVA está presente em uma pequena quantidade, mas existe. Sempre em busca da formação de profissionais de excelência.
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